A Activação!

O dia 30 de Julho jamais será esquecido, e varrido no meu baú de memórias. Passou-se tanta coisa, depois de muito tempo á espera nunca mais me chamavam. Eu e o meu namorado mais a pequena estávamos no hall de entrada do Hospital, á conversa e gargalhadas para passar o tempo. O calor começara a apertar.
Decidi fazer companhia á minha mãe, e ficou desconfiada ao ver duas crianças implantadas a subir para o primeiro piso. Levantou-se, aproximou-se ao balcão perguntando á docente, de cabelos encaracolados se iria demorar muito.
Esta respondeu, apertando os lábios e os dentes cerrados que ninguém faz chamadas, só tínhamos de subir e aguardar até que um responsável nos atendesse.

OK, ela podia ter-nos dito antes! Sabíamos lá nós, três horas para nada.

Inundou-me uma onda de saudade de voltar a ouvir com o Aparelho Auditivo, estava silenciosa há um mês, nenhum ruído fluía naturalmente. A sensação era tão intensa. Estava prestes a ser activada, a voltar ao mundo dos sons, dos ruídos indecifráveis. Aquele instante parecia durar uma eternidade.
Caminhava de um lado para o outro no corredor, para ver se ficava vazia de pensamentos, aparentemente estava DOIDA! Parecia não ter mais força.
Todos tentavam me acalmar, e eu respondia de modo agressivo. Só queria paz. Aquele momento era meu, só meu, e de mais ninguém assim fiz de conta que estava a olhar para a janela. Tive um flash, cheio de pedaços ocorridos, um eco fez-me sorrir e acalmar da delicadeza em que me deparei ao longo dos meses.

Veio alguém que carregava uma embalagem do Nucleus Freedom, um técnico que mais parecia ser rapaz, por detrás da sua aparência demonstrava competência e um simples aceno bastou, a resposta foi, pode entrar e assim foi, entramos todos.
Sentei-me á sua frente, a observar a caixa de papelão extremamente colorida enquanto abria um programa no computador e depois pegou no aparelho a ligar num cabo de filamento, os meus olhos dilatavam, e as palavras saiam mudas.

O meu Sun Melody ao vivo!

Finalmente, pede-me para colocá-lo por detrás da orelha, e a bobina na cabecinha onde está o chip, a primeira impressão é “não ouço nada”. Está silencioso… O técnico ainda não tinha activado, o á-vontade dele, sentia-o a fixar em mim, ansioso por uma reacção imediata.
Senti algo! Não tenho a certeza se era mesmo um som, ou não? Estava baixinho, muito até, de repente aumenta de volume, que confuso! Todos me observam, e retribuo-os o mesmo olhar vago e distante. È um som diferente!
Não percebo o que é. Então explica-me, que vai tentar equilibrar os sons altos e baixos para uma mesma frequência ondulante, em linha recta. Só tenho de levantar a mão, qual dos dois sons estão mais alto. OK. Tudo feito, os 22 eléctrodos ligados com SUCESSO.

Avisa-me para eu estar preparada, e não me assustar. É então que liga totalmente o aparelho! Fiquei prontificada! Assustei-me, dei um pulo na cadeira, o som do Implante Coclear é totalmente diferente e distinto do aparelho auditivo, fiquei admirada!
Ouço vozes, a minha voz e barulhos por todo o lado, quero chorar mas não consigo, faço força para que as lágrimas não caiam! Vejo a minha mãe a chorar… consegui entender a diferença das vozes humanas, a do meu namorado e técnico tem uma tonalidade mais ronca, grossa e forte, a da minha mãe é suave e delicada, difícil de perceber. A da minha irmã varia nestes dois extremos, pois ainda não tem a voz definida.

Escuto o barulho do papelão. Sai de lá ouvindo!!!